segunda-feira, 25 de julho de 2011

O papel dos advogados

Por Carlos Nejar,
escritor, integrante da Academia Brasileira de Letras, advogado e procurador de Justiça aposentado.

Infortunadamente, nem a Ordem da classe se dá conta disso, embora, aqui no Rio, o nobre presidente tenha lutado por melhor tratamento aos advogados, mas estão eles cada vez mais arredados do Poder Judiciário. Não falo do peticionar, que é constitucional, nem falo em contestar ou recorrer, muito menos de outras faculdades, que não são favores e que se aninham nos códigos .

Os advogados estão cada vez mais arredados do contato pessoal com a magistratura. Visível é a dificuldade com os julgadores de primeira instância, ainda mais os jovens, com exceções, que parecem munidos de terror, parcimônia , oficialidade, ou autossuficiência, sob a égide da tão falsa imparcialidade (nada é imparcial, tudo é julgamento, tudo entra numa sentença, até o trauma familiar, a felicidade ou a dor de dentes, ou o tombo na esquina), embora a paciência dos postulantes não envelheça.

Curiosamente falar com alguém de instância superior mostra-se mais fácil , cortês, civilizado, com um desembargador ou ministro do Supremo, por exemplo, que possuem, em regra, certa simplicidade conquistada, sem temor ou tremor de argumentos, segurando, em regra, o bom direito.

Essa desumanidade, ainda bem, não existe no interior dos estados, menos ainda com a ocorrência dos júris populares, onde defensor e Ministério Público litigam diante de enorme assistência.

A tal de digitação que considero infame, que avança por todas as instâncias, mormente no Plenário Excelso, não foi inventada apenas para acelerar a Justiça, que continua inefavelmente morosa; foi, sobretudo, criada para afastar o advogado da pessoa dos julgadores, colocando-os, ainda que não o queiram, numa esfera celestial, ausente ou abstrata das coisas humanas.

Digita-se o pedido, digitam-se as provas, digita-se a contestação, digita-se o argumento, digita-se o direito, digita-se o recurso, digita-se a paciência ou impaciência, digita-se a indignação, digita-se a lentidão do tempo, digita-se a obstinação de recolher exame de contendas, digita-se o medo do prejuízo ou dano iminente, mas não se digita o imprescindível rosto humano, como se fosse algo execrável .

Nem há proximidade, nem respiração de um ser a outro, querendo que os julgadores de superior instância se escondam no Olimpo ( não posso crer que seja iniciativa deles, tão cordiais e afáveis) e, vez e outra, voltem o semblante aos pobres mortais , sedentos de justiça. Quando não ocorre — sob pretexto de velocidade, procrastinação ainda maior da decisão dos feitos, longando-se, com as estações e os anos, salvo quando forem casos de repercussão e mídia. Se a estátua da Justiça já era cega, agora é totalmente surda e muda .

Com a dita modernidade , longe dos rostos e das vozes, parece estar enterrada, salvo melhor juízo, nos subúrbios da história.

Essa digitação que avança, com o verniz do progresso, não passa de um constante desumanizar do Direito, levado até ao absurdo, com números e senhas (verdadeira proeza é conseguir inserir-se nesta kafkiana burocracia).

Ora, quanto mais distantes ficarem os magistrados, mais distantes estarão os advogados, mais a computação de signos, como “máquina infernal ”, conduzirá para longe o conflito dos homens, a sensibilidade dos processos, a virtude da fala dita e ressoada, a paixão da defesa, o entusiasmo do raciocínio oralmente bem exposto, a eloquência dos antigos ( porque até a sustentação desaparecerá), decidindo os julgadores, sozinhos ou auxiliados, nas salas de gabinete, entre as nuvens e o constelar firmamento.

Diz Montaigne que “as almas dos imperadores e dos sapateiros são fundidas no mesmo molde”. Mas não, agora, a alma dos imperadores da justiça, os eminentes ministros, sei que até contra a vontade de alguns deles, humanistas, vai ficando de outro molde , sob as vestes inconsúteis das tão jurídicas senhas.

E o nosso mais alto Judiciário, residindo em Brasília, cidade construída para restar alienada do resto do país, apoiada nessa crescente e modernosa digitação, tende a gerar outra Brasília, a da alma , onde nada mais alcança, nem o paroxismo, a clarividência , ou o rumor de uma lágrima.

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Atores substituem testemunhas que não podem comparecer

Um cliente do advogado Marc Brumer, da Flórida, fraturou o calcanhar ao cair de uma passagem para pedestres. Mas na época do julgamento contra a construtora que fez a passagem, a única testemunha tinha mudado para outro Estado.

Brumer encontrou uma solução: contratou um ator profissional para ler o depoimento da testemunha ausente para a Corte. As informações são da Agência Reuters.

Ao ler o depoimento, palavra por palavra, e reproduzir o sotaque hispânico da testemunha, o ator descreveu a má iluminação e a ausência de placas de sinalização para pedestres da passagem.
"Ficamos todos pasmos", diz Brumer. "Era como se a testemunha estivesse lá". Pouco depois, a construtora encerrou o processo com um acordo extrajudicial.

Especialista em ações envolvendo acidentes pessoais, Brumer pertence a um pequeno grupo de advogados na Flórida que contratam atores para ler os depoimentos de testemunhas ausentes. Ele também comanda a pequena empresa Actors at Law, que arregimenta atores para advogados.

"Sou totalmente favorável ao emprego de instrumentos que ajudem o júri a entender as evidências", diz ele. "Quando o julgamento envolve um caso difícil, precisamos de todos os instrumentos possíveis para ganhar".

Pelo Código de Processo Civil norte-americano, os advogados são autorizados a ler em voz alta depoimentos para os júris quando suas testemunhas não podem ir ao julgamento. O depoimento da testemunha pode também ser gravado em vídeo.

Desde que seja esclarecido à corte que a pessoa que está lendo a fala não é a verdadeira testemunha, qualquer pessoa pode ler os depoimentos.

Fonte: www.espacovital.com.br

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Verdade

VERDADE
Carlos Drummond de Andrade

A porta da verdade estava aberta,
mas só deixava passar
meia pessoa de cada vez.

Assim não era possível atingir toda a verdade,
porque a meia pessoa que entrava
só trazia o perfil de meia verdade.
E sua segunda metade
voltava igualmente com meio perfil.
E os meios perfis não coincidiam.

Arrebentaram a porta. Derrubaram a porta.
Chegaram ao lugar luminoso
onde a verdade esplendia seus fogos.
Era dividida em metades
diferentes uma da outra.

Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.
Nenhuma das duas era totalmente bela.
E carecia optar. Cada um optou conforme
seu capricho, sua ilusão, sua miopia.

Um mundo menos carrocêntrico

Como o marketing de dias mais tranquilos ajudou a convencer americanos a deixar o carro em casa em Los Angeles

Na Los Angeles do início do século 21, pegar ônibus era o último recurso dos californianos. As linhas eram confusas, as placas de sinalização pouco descritivas, os veículos, velhos. Além disso, no país de Henry Ford e das carteiras de habilitação aos 16 anos, andar de carro é tão natural quanto respirar.
Foi ao perceber que enfrentava não só questões práticas para atrair usuários, mas também a impressão de que o transporte coletivo era muito ruim, que a prefeitura da cidade decidiu reformular todo o sistema. Mesmo antes das caras soluções de engenharia, com corredores exclusivos e linhas rápidas, começou a investir em uma ideia: andar de ônibus não só reduz a poluição e é mais econômico como melhora a vida do usuário.

- Decidimos nos posicionar como uma solução, e não apenas para chegar de um ponto a outro - afirma Maya Emsden, vice-diretora da Metro, empresa de transporte de Los Angeles, equivalente à Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC), na Capital.

Campanhas de marketing passaram a mostrar as vantagens de escapar dos engarrafamentos sentado confortavelmente em ônibus renovados. Restauraram a confiança no sistema ao garantir o cumprimento de horários. Mostraram ser possível deixar o carro em casa distribuindo mapas simples e fáceis de entender.

Tudo foi iniciado, em 2003, com uma unificação de todas as linhas e meios de transporte comandados pela Los Angeles County Metropolitan Transportation Authority. Antes dividida em diversas repartições públicas, cada qual com um nome, a empresa passou a ter, em ônibus, e metrô, o mesmo logotipo e o mesmo nome: Metro.

Meta para 2020 atingida em 2006

A reformulação se deu em toda Los Angeles, mas uma área, o Vale de San Fernando, virou a joia da coroa: ali, foi instalada, em 2005, uma linha de ônibus exclusiva, um Bus Rapid Transit, inspirado nos ligeirinhos de Curitiba. Conhecido como Linha Laranja, o corredor de US$ 330 milhões tem 14 milhas de extensão ao longo da engarrafada Highway 101.

No primeiro ano de operação, o sistema teve 6 milhões de viagens. Um terço desses passageiros deixou seu carro estacionado em casa e preferiu andar de ônibus. A meta de número de passageiros definida para 2020 foi batida já em 2006. Agora, a linha deve ser estendida em mais cinco estações. Para a vice-diretora, porém, o sucesso maior foi outro.

- O maior jornal da cidade chegou a dizer, em uma manchete, que o transporte coletivo em Los Angeles era uma piada sem graça. Conseguimos fazer as pessoas acreditarem que o sistema funciona - diz, satisfeita.

O passo a passo da ação

1) Primeiro, a Metro se dedicou a investir no tipo de comunicação que melhoraria a vida dos usuários imediatamente, conta Maya Emsden.

> Os ônibus ficaram fáceis de reconhecer, com cores unificadas que brilhavam à noite.

> As paradas ganharam as informações básicas sobre as linhas, os mapas com itinerários foram simplificados.

> Todo o sistema de cobrança e design do metrô - muito mais pop entre os usuários - passou a valer para o ônibus.

> O centro de atendimento ao cliente não funcionava à noite - passou a ter horário mais longo e ganhou pintura e letreiros em neon para atrair os usuários.

2) O passo seguinte era mais ousado: mostrar que a ideia de conforto e rapidez, normalmente associada aos carros, também valia para os ônibus. A inauguração da linha expressa no vale de San Fernando foi a oportunidade ideal.

> Outdoors passaram a anunciar a chegada do "ônibus que age como um trem", alguns inclusive na engarrafada Highway 101.

> A mensagem também vinha em comparações mais diretas entre o transporte individual e o coletivo: materiais como camisetas faziam contrapontos entre carros e ônibus com mensagens como "horrível/bom", "problema/solução" ou "estresse/alívio" (acima).

Redesign em LA rendeu prêmios

A programação visual da empresa de trânsito de Los Angeles foi totalmente remodelada. "Metro" virou o sinônimo de transporte público, simplificando a comunicação com os passageiros.

Criada na própria empresa, a nova marca ganhou reconhecimento internacional, com o prêmio ReBrand. Além disso, a frota virou até brinquedo — a fabricante Matchbox criou uma linha de ônibus em miniatura, o primeiro transporte público nos EUA a ser licenciado.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Alterações no Código de Processo Penal entram em vigor na terça-feira

(01.07.11)

Dentro de quatro dias, metade dos presos provisórios do Brasil poderá estar fora das celas. É uma multidão de mais de 80 mil pessoas, aproximadamente a lotação completa e simultânea dos estádios Olímpico e Beira-Rio, em Porto Alegre.

Essa debandada pode começar a partir da próxima terça-feira (5), quando entram em vigor novas medidas no Código de Processo Penal, estabelecidas pela Lei nº 12.403/2001, criada sob o aceno de tentar desafogar os superlotados presídios do País -, mas que, ao mesmo tempo, pode provocar uma onda de impunidade.

A norma torna mais difícil mandar para trás das grades suspeitos por prisão provisória. Ela visa a diminuir um contingente que é hoje próximo à necessidade de vagas nos presídios brasileiros: são necessárias 198 mil, enquanto há 164,6 mil presos sem condenação.

Antes de decretar a prisão de um suspeito, o juiz terá de analisar nove medidas alternativas. A prisão preventiva só será admitida em casos excepcionais, como, por exemplo, para crimes cuja pena é superior a quatro anos e em que exista clamor público.

Se a lei puder ser aplicada em favor dos atuais presos, um em cada quatro detentos gaúchos – cerca de 7,1 mil – teria direito a pleitear o benefício. No Brasil, eles correspondem a cerca de um terço da massa carcerária.

Conforme dados do Departamento Penitenciário Nacional, 165 mil pessoas ocupavam as cadeias do Brasil provisoriamente até fevereiro. A vigência do novo CPP é retroativa, ou seja, vale para todos os que já estão detidos. "É possível que criminosos inafiançáveis consigam ser libertados pela interpretação da lei. Tenho mais medo da interpretação do novo código do que da própria lei. Eu arrisco dizer que 50% desses 165 mil serão libertados", estima o promotor David Medina da Silva, coordenador do Centro de Apoio Operacional Criminal do Ministério Público do Rio Grande do Sul.

Segundo o promotor, as mudanças favorecem a impunidade e o crime e não servem para desafogar as cadeias e diminuir o custo do sistema prisional do País.

Ele diz que "com o novo CPP, cria-se uma série de alternativas à prisão preventiva. Muitas delas já são aplicadas, mas não funcionam. É uma estrutura que demandaria outra realidade do Brasil em todos os sentidos, e somos céticos com relação a isso. São medidas bonitas, mas num país onde as coisas andem bem. A ideia romântica de que vamos transformar o País a partir de uma lei e da Justiça perfeitas não existe. A criminalidade aumenta vertiginosamente e se abriu demais a possibilidade de um bandido perigoso ficar solto com esse recurso", afirmou Silva.

Para juízes, mudanças são essenciais

Rebatendo a opinião do Ministério Público, a juíza criminal Renata Gil, que também é vice-presidente de Direitos Humanos da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), afirma que "o discurso de que a prisão preventiva acabou é uma falácia". Ela avalia que "vai ser muito simples cumprir as medidas cautelares".

Para a magistrada, essas medidas "acompanham o anseio da sociedade, que é ver no cárcere somente pessoas que cometeram infrações graves".

A nova lei deve forçar os governos a investir na fiscalização do cumprimento das restrições cautelares. Sem recursos, porém, será difícil que as mudanças no CPP, como a manutenção de criminosos em prisão domiciliar por meio de monitoramento eletrônico e a proibição de que eles circulem em determinadas áreas, sejam eficazes.

Na outra ponta do debate, a polícia - agente que deve coibir o crime - não fecha questão sobre o assunto.

"Essa visão de que muitos bandidos vão ficar soltos é equivocada. O nosso sistema penitenciário está falido, prisão não corrige ninguém. Não é a cadeia que vai fazer com que a pessoa se regenere. A prisão preventiva deve ser para o último caso. A lei vai deixar recluso quem deve estar preso. Boa parte da polícia, sem dúvida, ficará insatisfeita, mas sempre vai haver alguém pra reclamar", diz o presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo, George Melão.

A prisão preventiva pode hoje ser concedida para crimes de reclusão em geral. Pela nova norma, a decretação é restrita para crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a quatro anos e só poderá ser determinada se não for possível substituí-la por nenhuma outra medida alternativa.

Além disso, o juiz ou tribunal que determinar a prisão deverá reexaminar o caso, obrigatoriamente, a cada 60 dias. Se o preso não apresentar os requisitos da prisão preventiva, o juiz deverá conceder a liberdade provisória, mediante fiança, ou determinar as medidas alternativas. (Com informações do Terra e da redação do Espaço Vital).

Fonte: www.espacovital.com.br