terça-feira, 22 de março de 2011

Código Florestal: um debate necessário

22/03/2011

Mal retomaram os trabalhos no Congresso e teve início a pressão sobre a mesa diretora da Câmara para a entrada em votação do projeto que reformula o Código Florestal. Mas, antes de mais nada, é necessário garantir um amplo e democrático debate sobre o projeto, que representa um verdadeiro retrocesso na proteção do meio ambiente. De acordo com o novo texto, propriedades rurais de até quatro módulos fiscais - 90% dos imóveis rurais do Brasil - ficam desobrigadas de recompor a área de Reserva Legal, a porção de terra com cobertura original para conservação, aumentando significativamente os desmatamentos. O impacto é altamente negativo, sobretudo para o efeito estufa, cuja redução está entre os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil em Copenhague.

Outra proposta é diminuir as condições para intervenção humana nas Áreas de Preservação Permanente (APP), como nascentes, margens de rios, topo de morros e encostas. Basta olhar para o resultado da ocupação irregular dessas áreas nas recentes tragédias no Rio de Janeiro para ter a dimensão da irresponsabilidade da revogação do atual Código Florestal. O projeto também propõe sobrepor as APPs à Reserva Legal, ignorando que cumprem funções específicas para a manutenção da biodiversidade, estabilidade geológica e combate ao assoreamento, entre outras, e que valorizam a produção e a própria propriedade.

Para os defensores do novo texto, a necessidade de ampliar a competição agrícola internacional e a produção de alimentos para o mercado interno justificaria a ocupação de todas as áreas agriculturáveis. Inúmeras pesquisas demonstram, no entanto, que há terras disponíveis e técnicas de produtividade suficientes para se elevar a produção sem devastar florestas. Na votação do relatório na Comissão Especial, entidades representantes da pequena propriedade e da agricultura familiar se posicionaram contrárias às mudanças. Sabem que o agronegócio é o maior interessado na alteração do Código.

O texto reformulado também anistia os desmatadores que cometeram infrações antes de 22 de julho de 2008. É algo inaceitável. Argumenta-se que 90% das propriedades estão irregulares, mas há uma questão pedagógica em jogo. Desde 1999 está em vigor a Lei dos Crimes Ambientais e a legislação já concede o prazo de 30 anos para uma propriedade recuperar o que devastou. O constante desrespeito ao Código vigente se dá pela certeza da impunidade, que o relatório Aldo Rebelo quer contemplar. Anistiar e premiar quem devastou acabará punindo quem preservou. O Estado deveria, ao contrário, recompensar a preservação com o pagamento dos serviços ambientais.

A tentativa de revogação e/ou flexibilização da legislação ambiental, enfraquecendo os órgãos de gestão e fiscalização do meio ambiente e seu sistema nacional, dará ainda aos Estados e Municípios uma super autonomia, que trabalha a favor do agronegócio e da especulação imobiliária nas cidades.

A questão é complexa e merece ser melhor analisada. A tramitação açodada do texto, à luz da pressão de interesses imediatistas, significa na prática negar o direito à participação da população em uma discussão da maior relevância. Por isso, a sociedade deve se mobilizar para ser ouvida e para que não se consume este grave retrocesso na legislação ambiental brasileira. Afinal, o desenvolvimento sustentável e a preservação da biodiversidade é um problema de todos.


O autor, Ivan Valente, é deputado federal pelo PSOL-SP. É membro da Frente Parlamentar Ambientalista, integrou a Comissão Especial do Código Florestal e compõe a Câmara de Negociação formada para debater o projeto.

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